sexta-feira, 1 de agosto de 2025

Navegar a vida: entre o desejo de definição e a liberdade de fluir

 


Na tradição fenomenológico-existencial refletimos muitas vezes sobre a frase: “a existência precede a essência”. Mas talvez hoje, mais do que reconhecer a inexistência de uma essência fixa, possamos voltar o olhar para o desejo que nos move. Podemos perguntar: por que o ser humano busca tanto uma essência? De onde vem esse desejo por algo que o defina, o contenha, o segure?

A imagem que vemos aqui, múltiplos corpos entrelaçados, sobrepostos, em transição, expressa esse drama: o conflito entre o desejo de ser algo sólido e a vivência real de ser fluxo. Há um movimento interno, quase líquido, entre nascimento, tensão, dor, entrega. Nada está parado. Nada é uma coisa só. Ainda assim, buscamos uma ideia de “quem eu sou”, como se fosse possível conter o oceano em um pote.

Mas e se não for uma essência que nos liberta, e sim a habilidade de navegar? A abertura à mudança. A confiança na transformação. A fé, não no sentido dogmático, mas como gesto existencial: um confiar no porvir sem precisar controlá-lo.

Fluir com a vida é um trabalho. Um trabalho de escuta, de tolerância à incerteza, de presença no agora. E isso, talvez, seja mais terapêutico do que encontrar um “eu verdadeiro” escondido atrás das camadas. Talvez, nossa saúde esteja menos em descobrir “quem somos” e mais em nos permitir ser atravessados pelas experiências, e nos refazer, com leveza e coragem.

O ser humano busca uma essência, muitas vezes, por medo da instabilidade. Mas paradoxalmente, é a aceitação amorosa da instabilidade que mais nos fortalece.

A imagem mostra: somos processo. Somos corpo em movimento. Somos camadas que se desfazem e se redesenham. E talvez, só talvez, essa seja a única essência que vale a pena reconhecer, a do viver como presença em mutação.